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O pinheiro grosso de Canela, RS

Sua majestade a fêmea de araucária  conhecida como Pinheiro Grosso que, mesmo com mais de 700 anos, continua produzindo pinhões. 

As araucárias são estes magníficos pinheiros relativamente comuns na paisagem urbana e rural do município de Canela e de toda a Região das Hortênsias. São como guarda-chuvas revirados pelo vento, exibindo seus galhos invertidos para cima com suas copas únicas num entrevero de galhos se entrecruzando como que abraçados uns nos outros, formando um cenário verde escuro que só pode ser vistos aqui no sul do Brasil, nas terras altas do planalto do Paraná ao Rio Grande do Sul.

Sua valiosa madeira serviu de moeda no início da colonização da região e foi explorada quase ao extremo, colocando a espécie em níveis críticos de extinção. Hoje está protegida por lei e vai sobrevivendo em áreas mais remotas onde é responsável por alimentar uma vasta cadeia alimentar de animais que dependem de suas sementes – o pinhão.

Sobrevivente de uma época em que os dinossauros vagavam por aqui, estas magníficas árvores encantam pela sua forma única, com seu tronco cilíndrico, alto e com galhos apenas no alto. O pinheiro sempre esteve na minha memória. No terreno da casa onde nasci na Rua Dona Carlinda aqui em Canela, ainda existem duas grandes araucárias que, quando era criança, estavam lá e já as achava gigantes. Hoje ainda estão lá majestosas e parece que o tempo não às afetou. Elas estão 60 anos mais velhas, assim como eu, e parecem iguais. Eu já comecei a diminuir de tamanho e elas continuam crescer, indiferentes as mudanças da cidade, ao dono da casa ter mudado e muitas de suas parceiras terem sido removidas.  Parece que os pinheiros são imunes ao que nos afeta diretamente: o tempo. A escala temporal deles é de centenas de anos, e a nossa e dezenas. Esta é a diferença. Quando entramos no ocaso da vida, pelos setenta, oitenta anos, elas estão entrando na sua juventude. Imagino o nosso Pinheiro Grosso, do Parque Municipal, com seus setecentos anos, um verdadeiro testemunho da história da cidade e da região. Ele viu os índios Coroados coletarem pinhões, fazerem suas casas subterrâneas, criarem filhos, migrarem, morrem e nascerem por inúmeras gerações. É possível até que algum índio tenha subido em seu tronco para apanhar algumas pinhas dos galhos, já que é uma fêmea e até hoje produz sementes.  Ele foi testemunha de secas, enchentes e incêndios nas matas e campos próximos e mesmo em seu entorno. Por algum truque ou sorte, escapou do fogo quando ainda pequeno e vulnerável e se tonou alto, forte e com casca grossa o suficiente para suportar o fogo rápido das queimadas posteriores. Viu chegarem os primeiros fazendeiros, os colonos, os madeireiros e a estrada de ferro. Algum milagre o livrou das serras e machados dos anos da exploração dos pinheiros que durou até a segunda metade do século passado.

A mata onde está o Pinheiro Grosso é de uma grande diversidade e integridade ambiental

Como um único filho restante de uma família numerosa, o Pinheiro Grosso de Canela deve olhar em volta e sentir uma angústia apertada por não ver seus irmãos de genética com a mesma idade e, ao contrário, enxergar muitas coisas novas e de um brilho diferente, que crescem até um ponto e estacionam, abrigando no seu interior pessoas que se parecem com aqueles índios de outrora, mas que tem outros hábitos e são mais agressivos com suas ferramentas novas e mudam muito as coisas onde se instalam, contrariamente aos outros. Fica imaginando quanto tempo ainda vai poder procurar antes de tombar e se reduzir a centenas de nós-de-pinho, a sina das araucárias.

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