Blog Andando por Aí

Cedo da manhã

Cedo2Sabiá-laranjeira com seu lanche recém catado no gramado 

Hoje acordei mais cedo que o meu habitual. Ainda era escuro e a cama me expulsou por estar cansada de mim. Mate pronto, janela aberta, temperatura amena, luzes ainda dos postes da rua olho para a barra do dia e já vejo um tênue sinal alaranjado do novo dia que se insinua lá para atrás da igreja. A sinfonia da passarada começa tímida e, como sempre, liderada pelo sabiá que emite seu trinado forte rompendo o silêncio do final da madrugada, avisando a todos que o dia não tarda. Despertados pelo canto do sabiá e pela luz que aumenta gradualmente, outros cantores vão surgindo; a corruíra, me parece, desenvolveu seu complexo e harmonioso canto para compensar seu pequeno tamanho e se exibe garbosa antes de iniciar seu ritual de caça às aranhas nas frestas de qualquer parede; o risadinha emitindo suas notas descendentes que lembram a risada de alguém após ouvir uma boa piada; quero-queros despertam avisando a todos de seus ninhos; papagaios-do-peito-roxo já se movimentam em bandos emitindo gritos e se deslocando atrás de algumas sementes ou brotos novos de folhas de araucária; corucacas, tico-ticos, sanhaçus-cinzentos, pitiguaris, tucanos e muitos outros iniciam a sinfonia da madrugada. Sem partituras ou maestro, cada um executa seu instrumento no seu tempo compondo uma música única mesclada de harmonias, trinados e gritos formando um caos organizado que nunca se repetirá igual, assim como o são as luzes do início e do final de um dia.

cedo1Uma corucaca em um de seus poleiros: a cumeeira de casas e galpões.

Agora o dia já se impôs e o sol apagou a luz dos postes, reinando absoluto. Vou a janela e vejo que a sinfonia da passarada diminuiu muito, quase cessou. Agora os sabiás desfilam pelo gramado atrás de minhocas e insetos, sabendo que tem que abastecer as bocas famintas que estão nos ninhos. Vejo também um sanhaçu-cinzento comendo as pétalas das flores da goiabeira-serrana, que este ano se encheu delas, prometendo muitos frutos no verão. A corruíra desfila pelas frestas do muro e entre as alfaces da horta catando o que encontra com patas, antenas e asas. Um tico-tico cata grãos pela calçada em frente e sempre de olho nos gatos. Uma laranjeira do meu vizinho da frente, ainda com muito frutos maduros, mostra o intenso entra e sai de comedores de fruta, destacando-se o sanhaço-papa-laranja e o bandeirinha. Um vai e vem dos lugares de alimentação para os ninhos é a tônica aqui nestas primeiras horas do dia, mostrando que a pegada é cedo e que o instinto de criação de filhotes é um comportamento inato que envolve os casais num frenesi de buscar comida, limpar o ninho e afastar os gaviões e gralhas para que todos consigam alçar voo no final da primavera. Penso no trabalho destas pequenas aves para construírem seus ninhos, criarem e cuidarem dos filhotes num frenesi de vários meses até que se libertam das crias para seguirem a vida até a próxima estação, sempre desviando de gatos e gaviões. A natureza não é romântica, ela é crua, severa e não admite erros. Só os que se adaptam e resistem as mudanças, que são muitas e permanentes, sobrevivem.

Cedo4Sanhaçu-cinzento, um comedor de frutas e de pétalas suculentas das flores da goiaba-serrana

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