Blog Andando por Aí

Eu sou a poeira

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Sou fina, leve, de várias cores e estou por todos os lugares deste mundo velho com muitas porteiras. Sou formada da terra que se esfarela e me deixa tão pequena que posso flutuar e ser levada pela mais débil brisa. Saio de uma estrada de terra quando o vento sarandeia forte ou quando carros e caminhões passam e me arrastam para cá e para lá. Gosto mesmo é de andar por aí vendo tudo de cima, embalada pelo vento, meu transporte preferido.

Quando ele se cansa, eu me deito sobre o que estiver por baixo. Cubro as folhas da vegetação até que a água da próxima chuva me arranque dali. Entro nas casas e me espalho sobre móveis, tapetes, assoalhos e vejo o incômodo que causo às donas de casa, minhas inimigas mais destemidas, uma vez que, ao me verem, removem-me com panos úmidos durante a faxina doméstica. Gosto mais dos sótãos e dos galpões, pois lá eu fico mais tranquila e faço grossos depósitos. Desta forma, vou conhecendo poeiras de muitos lugares que vêm e se acumulam em camadas e contam histórias de lugares distantes e de ventanias fortes e fracas.

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Fora das casas e galpões, eu me acomodo onde o vento me deixa, sem escolher lugar ou hora. Posso me depositar no fundo de um vale onde acabo aprisionada pelas raízes que gostam muito de mim, já que trago minerais preciosos e que acabam fazendo parte dos tecidos das plantas, o que considero uma grande honra. Noutros lugares, fico exposta ao tempo, sem proteção de um telhado, raízes, folhas ou rochas e me transformo naquilo que os homens chamam de deserto. Aqui sou muito vulnerável ao vento, que me arranca sem piedade e me joga para cima fazendo-me viajar para muito longe, atravessando oceanos e continentes.

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Quando repouso em local tranquilo e fico ali por longo tempo recebendo sempre mais solo de muitos lugares, vou formando rochas de areia fina e contribuindo para a formação de novos ambientes, sempre modificando a face da terra. Pó que sai de lá, deposita-se aqui e o que sai daqui, deposita-se lá. Nada é criado, tudo se rearranja. O vento me falou, certa vez, que me leva a todos os lugares para que eu bem os conheça e nunca pare de agir e modificar as superfícies, tal como ele faz. Disse também que a alma do planeta é esta junção de forças que atuam de forma contínua para estar sempre em mutação, movendo-se e se reinventando como um grande ser vivo. Aprendi que, se me permitirem, cubro qualquer coisa e posso, assim, apagar o passado e criar o presente. Eu sou a poeira.

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