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As estradas caçadoras

Zorrilho atropelado, uma das milhares de vitimas da nossa biodiversidade.jpg

A caça, oficialmente, é proibida no Brasil, com exceção feita a algumas espécies introduzidas (exóticas), caso dos javalis, invasores agressivos e nefastos ao ambiente natural, e as lebres. Matar uma capivara silvestre para comer é crime, assim como qualquer outro animal da fauna considerada nativa do Brasil. Países do Prata têm caça permitida para algumas espécies como a perdiz, o perdigão, e várias espécies de marrecas, sempre atendendo a um calendário que respeite o ciclo de vida das espécies.

Poucos se dão conta de que há, por todo o nosso imenso território nacional, milhares de eficientes caçadores espalhados como serpentes por todos os ambientes, sejam parques de preservação, praias, cidades ou desertos. Esses caçadores são as nossas estradas e a munição, os carros, os caminhões e os ônibus. Mata-se mais nas estradas do que em qualquer outra circunstância, e a culpa é atribuída, singelamente, aos próprios animais que andam onde não devem, como se pudessem perceber os perigos de um veículo em movimento em uma estrada qualquer.

A noite é o período mais nefasto para a fauna que, ignorante do perigo, atravessa, permanece ou mesmo anda sobre as estradas, indiferentemente ao movimento de veículos, sendo atropelada e, muitas vezes, causando graves e até fatais acidentes para os condutores. Esse é um fato que se lamenta e não se tem uma solução eficiente, já que as estradas são tão vitais como é a necessidade dos animais de se movimentarem, instinto que os impulsiona à busca de alimento, de parceiros e abrigo.

Quanto mais estradas, mais carros e mais mortes. A equação não é fácil, já que um não entende o outro. Um permite o andar rápido por necessidades diversas, como entregar uma carga, chegar a um destino de férias, ou retornar para casa; outro anda lento, sem pressa, atrás de comida; cuida dos filhotes ou foge de predadores naturais. O atrito é iminente e, na maior parte dos casos, impossível mesmo de ser evitado.

Tem razão o homem quando, para evitar um acidente maior, atropela um quati, um zorrilho, um lagarto, uma tartaruga, uma pesada capivara ou um mão-pelada que se atravessa na via. Tem razão o quati, o mão-pelada, a capivara, o lagarto, a tartaruga e o zorrilho que apenas utilizaram mais um espaço do seu já reduzido ambiente para se deslocar.

De quem é a culpa? Dos bichos por andarem? Dos homens que construíram e utilizam as estradas?

Há um grupo de pesquisadores da UFRGS – o Núcleo de Ecologia de Estradas e Rodovias (NERF) – que, desde 2011, tem o objetivo de avaliar os efeitos das estradas sobre a biodiversidade e, sobretudo, criar procedimentos e ferramentas amostrais e analíticas para apoiar os licenciamentos dessas obras.

Os dados que levantam são assombrosos e mostram o potencial nefasto que as rodovias têm para eliminar uma fatia considerável da nossa biodiversidade, principalmente mamíferos e répteis (https://www.facebook.com/nerf.ufrgs).  O atropelamento de animais em rodovias é considerado a principal fonte antrópica de mortalidade direta de vertebrados terrestres em diversas regiões do mundo (Siriema – http://www.ufrgs.br/siriema/).

Outro projeto que trabalha com dados de atropelamento de estradas é o Centro Brasileiro de Estudos de Ecologia de Estradas (CBEE), que tem um portal no qual qualquer pessoa pode se cadastrar para enviar fotos de animais atropelados que são analisadas pelos especialistas, identificadas as espécies e os registros jogados no sistema.

As estimativas mostram que mais de 15 animais morrem atropelados nas estradas brasileiras a cada segundo e que, diariamente, devem morrer mais de 1,3 milhões, chegando-se à absurda cifra de 475 milhões ao final de um ano. Nenhum exército de caçadores conseguiria atingir essas sinistras marcas. Você também pode colaborar com informações, cadastrando-se no sistema Urubu (http://cbee.ufla.br/portal/sistema_urubu/) e passar a enviar fotos para ajudar a encontrar formas de preservar a vida dos condutores dos veículos e dos animais que cruzam pelas rodovias.

Acho que ainda estamos sendo muito egoístas em culpar apenas os bichos, já que somos nós que nos imiscuímos onde eles estão. Mas isso é muito polêmico e necessita de muitos estudos, consciência e outras crônicas para que se consiga alguma luz.

 

Zorrilho atropelado, uma das milhares de vitimas da nossa biodiversidade

 

 

Advertência para os motoristas, mas não para a fauna

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