Blog Vale do Rio Silveira

O campo de inverno

vissVista geral do vale do Rio Silveira neste final de inverno, com seus campos parcialmente queimados.

Os campos nativos do nordeste do Rio Grande do Sul entram em uma espécie de descanso durante o inverno. As gramíneas param de crescer no final do outono, quando suas espigas já estão maduras e recheadas de sementes. A coloração das folhas e hastes vai ficando cada vez mais dourada indicando a morte da parte aérea da planta, transformando o cenário em um lugar único, parecendo que foi pintado de ouro. O gado, segundo os criadores, não come esta palha dourada e o campo fica com pouca oferta de pasto palatável, restando a alternativa de pastagem de inverno ou a redução do número de bocas no campo.

Desenhos na água

Em muitas das minhas caminhadas pelo rio Silveira tenho visto, em algumas curvas ou remansos, depósitos de uma espuma branca que fica dançando ao sabor da corrente e parece prisioneira do local, conformada com a impossibilidade de fugir dali. Esta espuma, formada pelo movimento próprio da água e da matéria orgânica nela existente, vai se acumulando e circulando criando verdadeiras pinturas abstratas dignas de um momento de atenção, ou de um quadro. A cada minuto tudo muda e novas criações são apresentadas, com novos traços e imagens espetaculares que surgem e se desmancham em segundos, desafiando o observador a ver ali um significado, uma imagem, uma paisagem. Fico olhando e montando mil desenhos de coisas e até de gentes que se formam e se deformam em quimeras irreconhecíveis.

A leitura da pedra

Pequena ilha de pedra mostrando o limite para instalação dos líquens

Uma ilha, por definição, é uma porção de terra ou rocha cercada de água por todos os lados, independente se estiver num oceano, rio ou lago. Aqui no rio Silveira, em São José dos Ausentes - RS, há inúmeras ilhas ao longo de seu curso, sendo algumas grandes com pasto abundante, matas e uma fauna que se aproveita destes espaços mais seguros. Capivaras e lontras são frequentes habitantes, visto que as águas que as cercam não serem problema, já que são bem adaptadas ao nado e mergulho.  As ilhas menores surgem aleatoriamente como vigias no meio do rio e são habitadas por poucas espécies de líquens, musgos e algumas gramíneas. Geralmente são formadas por cristas e pontas de rochas mais resistentes ao desgaste provocado pelo embate da água e de detritos trazidos pela correnteza e são bons pontos de apoio para algumas aves pescadoras, como as garças e socós.

Uma capela no morro

Vista da Capela num final de tarde. Pousado na cruz, um falcão quiri-quiri, alheio a história, procura suas presas. 

Igrejas e capelas existem em praticamente todas as cidades, vilas e povoados deste Rio Grande do Sul, atestando a fé de um povo e a implantação de uma cultura religiosa que aqui se consolidou juntamente com a colonização. Cada rincão tem sua capela ou igrejinha, cada cidade tem suas igrejas ou catedrais, sempre próximas dos centros mais movimentados. Aqui no Vale do Rio Silveira não é diferente, abrigando uma comunidade com forte tradição religiosa que cultua suas casas de orações com muita devoção e dedicação. Mas tem uma capela que escapa a esta regra, localizando-se no alto de um morro aqui na Vila do Silveira, distante da vila e erigida em terras de propriedade de Francisco Boeira, descendente de um dos pioneiros que colonizaram esta região. Nas suas palavras... “A Capela é uma homenagem que procurei fazer aos meus ancestrais e a todos quantos - indígenas, jesuítas, portugueses, escravos, tropeiros ou agregados - viveram ou transitaram ao longo dos séculos por aquelas paragens em que se localiza a fazenda”.

Inverno no Vale do Silveira

Leito do Rio Silveira com pouca água e o campo com sua cor de inverno

O inverno deste 2021, aqui pelo vale do Rio Silveira, está se apresentando com grande alternância de temperaturas, indo de quase insuportáveis 8 a 10 graus negativos com geadas e nevascas, até dias ensolarados e quentes, como neste início de agosto com muitos dias ensolarados e uma perspectiva de seca que já é percebida pela pouca quantidade de água nos arroios e no próprio rio Silveira. Esta situação de poucas chuvas favorece o trabalho de andar pelo leito rochoso do rio e me permite fazer registros fotográficos que em tempos de vazão normal, não poderia. Os grandes lajeados que se formam aqui nas terras da Pousada Cachoeirão dos Rodrigues, criam poços, corredeiras, rasos e remansos que se prestam a contemplação através de uma caminhada pelas águas ligeiras do rio ou pelas suas margens. Troncos trazidos pelas cheias descansam nas rochas, torcidos e quebrados que foram, e ali aguardam novas ondas de enchentes para serem quebrados, moídos e levados mais adiante até se transformarem em pedaços cada vez menores e encalharem em alguma curva rio abaixo, eliminando qualquer vestígio de sua identidade anterior.

Recicladores

Crânio de capivara já limpo pelos diversos recicladores

Criar gado na região nos campos e várzeas do Vale do Rio Silveira é uma atividade ancestral que foi trazida pelos primeiros colonizadores que se encantaram com a pujança dos campos nativos de altitude. Clima severo, é certo, mas com paciência e domínio das técnicas de criação, foram se implantando as sesmarias e as divisões de terra para criação do gado rústico que fornecia carne para o charque, couro, queijo e derivados que eram trocados por outros gêneros durante as tropeadas serra abaixo.

As lontras do rio Silveira

Lontra curiosa me olhando, poucos segundo antes de sumir no rio Silveira

Criar peixes em açudes para pesca esportiva ou de subsistência, é uma prática comum em quase todos os rincões dos campos daqui de São José dos Ausentes. Peixes nativos ou exóticos são criados em açudes e permitem aos proprietários uma oferta de proteína animal que se completa com a carne de gado ou da ovinocultura. Como todo negócio rural, a criação de peixes também tem seus problemas relacionados a predadores que enxergam, na criação, um fácil mercado para satisfação de sua fome. Entre os criadores de gado, ovelha e galinha, aparecem o puma, o graxaim e a jaguatirica para dividir o butim.

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