Blog Vale do Rio Silveira

Mateando nas alturas

Topo do Morro dos Gaiteiros com a neblina cobrindo o vale abaixo. No fundo, o Morro Maracajá.

Levantar-se antes do sol, preparar um mate, calçar botas, colocar roupas grossas para segurar o frio, recolher o equipamento fotográfico e subir o Morro dos Gaiteiros para assistir o deslumbrante nascer de um dia no Vale do Rio Silveira, aqui na Pousada Cachoierão dos Rodrigues, é um programa imperdível. Melhor ainda quando amanhece o dia com o vale coberto de neblina densa, escondendo tudo de todos. Subir o morro é o segundo desafio, já que o primeiro foi sair da cama quente e enfrentar o frio da madrugada. A carga de orvalho nas hastes da vegetação do campo molha o que alcançam, mas a cada passo a expectativa vai aumentando e o fôlego diminuindo, antevendo-se que o esforço pode valer a pena. Chegando perto do topo do morro, vejo que a neblina densa vai ficando abaixo de mim, como se eu emergisse de uma nuvem que tudo branqueia, esfria e molha. De cima já é possível ver o horizonte de leste, ainda meio fechado, mas prometendo horas de sol e calor na sequência do dia.

Subida do Morro dos Gaiteiros

Botas encharcadas e o corpo acelerado pelo esforço, mate quente descendo pela garganta, contrastando com o frio externo, traz alento e conforto ao estômago, já reclamando alguma coisa para trabalhar. O visual é bárbaro e aproveito para descansar meu mate numa pedra para melhor aproveitar o momento. Poucos sons, além daqueles enviados pelas corredeiras do Rio Silveira, logo abaixo, e a sinfonia da alvorada que, por aqui é composta por músicos emplumados de muitas espécies, cada um com seu instrumento, sua música e pouco ligando um para o outro. Assim, desta forma, o concerto do amanhecer não necessita de maestro, apenas de músicos que, a seu modo, cantam, gritam e fazem o que sabem para anunciarem o despertar para mais uma batalha atrás de comida e de autodefesa. Graúna, saracura, sabiá, tico-tico, canário-da-terra, seriema, carancho, gavião-carrapateiro, pica-pau-do-campo, joão-de-barro e tantos outros que nem conheço afiam suas siringes para informar a todos que o dia surge.

Topo do Morro dos Gaiteiros. Ao fundo, o Morro Chato já com sol.

Agora acomodado numa pedra grande e úmida, fico vendo a batalha do sol tentando furar o bloqueio das nuvens baixas e me delicio com os raios quentes e brilhantes que chegam na minha pele e penso que, logo abaixo, tudo ainda dorme sob o branco úmido da neblina. Viver nas alturas tem alguma vantagem, eu penso. Aqui o sol chega primeiro, e vai embora por último e assim este deveria ser um lugar de reflexão, sagrado para algumas culturas, mas para mim apenas um lugar muito especial, onde as ideias se alinham e permitem organizar a mente e acalmar o espírito, ajudando a perceber o tamanho e a importância da natureza. Enquanto o sol vai subindo, goles quentes e amargos do doce chimarrão parceiro vão descendo e aquecendo o meu corpo. Vejo abaixo cada vez menos neblina e cada vez mais os detalhes do Vale do Rio Silveira. Desço com vagar o Morro do Gaiteiro com o mate já lavado, a térmica vazia e vou direto para a mesa do café, sedento pelas delícias preparadas pela anfitriã, dona Rosane.

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